segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Apresentação do Projecto «As indústrias locais em São Vicente»

Grupo de Jovens: Filipa, Miguel, Eduardo e Fátima.

Bordado madeira e toalha de linho (Dona Bela).

Podoa, machado e gancho de fio (Sr. Freitas).

Cestos ou balaios e vimes (Sr. Artur).

Tapetes de retalhos (riscas casadinhas, espingardas e lagartinhos) e de lã (Sr. Oliveira)

Infusa (Sra. Marta Oliveira)

Telha de meia cana ou canudo (Olaria dos Lameiros).

Cesto do almoço (cesto do Sr. Artur e toalha de linho da Dona Bela).

Ressalga (Sra. Teresa Faria).

Alqueire (Sr. Freitas).

 
Apresentação do trabalho (Miguel Freitas).

 Assistência no «Núcleo Museológico - Rota da Cal»

 Lanche-convívio.

Convivio entre o grupo de jovens e a população local.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Gregório Gabriel de Oliveira, 66 anos

O senhor ainda se lembra da olaria?
- Lembra-me disso, da olaria.

O que faziam na olaria?
- Faziam... faziam púcaras em barro... coisas... outras coisas não... faziam mais coisas mas, mais me lembro o que também me lembro era mais das coisas mais dos restos.

Como produziam as peças de barro?
- Era da terra, era do barro. Não eram coisas que eles fossem comprar, que era tirado da terra e aquilo era cozido. Era cozido, tinha uma coisa por baixo e tinha aquelas pedras, pedras como tem hoje em dia no forno, aquela pedra de forno, mesmo, aquilo era cozido e eles faziam... Faziam a massa e fazia o forno, e tinha o forno.

O que faziam com as peças de barro?
- Vendiam. Era para vender. Nesse tempo sempre vendiam. Não era para uma pessoa... uma pessoa só. Aquilo era para vender.

Sabe dizer-nos porque é que fechou?
- Fechou porque, claro, depois aquilo ninguém se interessou mais que aquilo... Depois houve aquelas coisas já por outros lados e aquilo, as pessoas, aquilo já não se importavam. Nasceu noutros lados, coisas mais fáceis.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Maria Conceição Capontes, 76 anos

Fotografia: Casa da Cal do forno do Barrinho.

A senhora ainda se recorda do forno da cal?
- E depois quando era para eles ir lá, que o forno cozia 24 horas, aquilo não havia dias santos, era domingos e tudo, e depois eles iam lá puxavam aqueles ferros, aquela pedra caía toda para baixo, os homens iam juntando em cestos e botando assim espalhada pelo forno dentro. E depois, eles pegavam, tinha homens a acartar água, tinha um poço, ainda há de estar lá, e.. eles deitavam água naquilo e eles pegavam com os aguadores e iam deitando água na cal. Depois aquilo, ela ia fervendo, é que ia rebentando as pedras. Que, um dia tinha frieiras que não podia andar, o meu pai disse quando lhe fosse lá levar o comer metesse os pés naquela cal. Olhe aquilo estava escaldando, foi escorrendo sangue! Eu vim-me embora, lixei-me. E depois daquela cal estar assim, eles punham uma ciranda grande, amarravam o lenço das mãos assim no nariz e outro dia era para cirandar aquela cal, um do lado e outro do outro, botando aquilo pela ciranda fora, o que era pó caía para baixo e o que era entulha caía e eles tornavam a levar aquilo para lhe dar mais um cozimento. Sim senhores.

Quantas pessoas trabalhavam no forno da cal?
- Trabalhava o pai, estava o Francisco do Pereira, o do Rego, e trabalhava o Agostinho da Candinha, do Cascalho, o pai da mulher do “dezoito”, trabalhava lá. O Agostinho da Candinha era daquela que dava bordados, e trabalhava também lá, trabalhava o tal que eu estou dizendo, o pai da mãe da mulher do “dezoito”, trabalhavam lá nessa altura. Era na pedreira, tiravam a pedra, e depois tinha homens a acartar a pedra de barreleiro para o forno, e depois era assim, e tinha... Eles iam cortar lenha pela serra fora, então o meu irmão Manuel e o Manuel Vicente, que ainda está ali vivo, acartaram lenha dali, do poço do Cabrobeiro, para o forno, davam três... Cinco caminhos por dia, para ganharem 500$00. Era uma vida amargosa. Ora se era duro. E eles iam pela serra fora, e eu ia-lhe levar comer, que eles faziam aqueles cortes de lenha, deitavam pelos corgos abaixo e depois iam acartando para lá para o forno, que aquilo cá era lenha grossa para cozer aquilo. Aquilo levava uma camada de lenha, uma camada de pedra, uma camada de lenha, uma camada de pedra. E aquilo estava vinte e quatro horas a cozer, acolá, e ao depois, ao cabo das vinte e quatro horas eles iam todos. E depois, quer dizer, era uns a tirar a pedra para espalhar, para cirandar, e outros a acartar água de lá de dentro, do poço do Barrinho da cal para eles derreter aquilo. O trabalho do forno era isto.

E a lenha da serra?
- Na serra cá era, tinha homens, mas quer dizer que era, faziam o corte de lenha por sua conta. Já não era por conta do patrão, era por conta deles e depois vendiam a lenha.

O que faziam com a cal?
- E eles acartavam a cal. Não era os homens. Mas tinha-se de falar. Então a gente acartamos cal, acartamos cal de lá para a igreja do Rosário, subia-se ali pela cerca fora. Eu ainda acartei cal para a igreja do Rosário. E eles levavam para a Ponta Delgada e... Os homens acartavam, ganhavam 2$50 para ir à Ponta Delgada, para pôr sete alqueires de cal na Ponta Delgada. Ganhavam 7$50. Era uma vida amargosa, o forno.

O trabalho no forno da cal era muito difícil?
- Ganhavam uma coisa de nada. E para lavar aquelas roupas! Aquilo era uma desgraça, que aquilo não, aquilo... a cal cá... Então a mulher do José Ponte, a mãe desta Alfonsa, acartou cal para a Ponta Delgada, que era o ganho de um e a bezerra, ali... Levavam cal para a Ponta Delgada e ela nunca, nunca... Chegava a casa e nunca tomava banho, e depois ela tinha um cabelo como a Alfonsa, depois foi preciso lho cortar rente e ela andou tantos tempos doente da cabeça enquanto aquilo não crescia. Que aquilo era pegadiço... e na altura não havia sabão para lavar aquelas roupas. A minha mãe ainda chegou a comprar sabonete para se lavar as camisas do pai, que aquilo ficava a pegar que não havia quem tirasse aquele pegamento da cal, aquilo era um trabalho amargoso.

Maria José de Castro, 74 anos

O que se lembra do forno da cal?
- O que eu me lembro do forno da cal, é o meu avó era sócio mais o Sr. Gregório. Mas o meu avó morreu e depois foi só o Sr. Gregório.

Sabe quem trabalhava no forno da cal?
- Quem trabalhava eu já não me lembro. Mas o meu marido é mais velho, talvez saiba.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Teresa de Jesus Andrade, 69 anos

A senhora recorda-se do forno da cal?
- O que me lembro era assim, a gente ia por lá acima, tinha-se medo de se debruçar sobre aquele poço que ficava fundo, que se a gente caía lá dentro aquilo estava fechado, ninguém tirava a gente de lá para a rua. Até tinha medo do forno da cal.

E onde ficava a pedreira?
- Onde tiravam a pedra era diferente. Era do outro lado. E depois foi quando deu aquela quebrada que matou os dois homens.

Sabe nos dizer quem foram as vítimas desse acidente?
- Era o pai da Laurindinha do Lombo, que ainda está viva, João Alexandre, o pai dela, e o João Gregório, que é o pai do Sr. Andrade Gregório que está nas Feiteiras. Morreram os dois nesse dia. E nesse dia lá estava o Agostinho Diniz, o pai do... Acolá, do que se chama João Baleia, o pai dele estava e ele também ainda ficou aterrado pelos joelhos. Ora! E a gente era crianças e ficou-se com medo, tinha-se muito medo de mortes nesse tempo, depois tinha medo a ir por lá acima, marginava-se muito porque se ia à lenha, ia ao mato, naquele tempo era assim.

Quantos fornos existiam?
- O Sr. Jana fazia a cal dele, cozia ali, havia ali um forno de cal no Lombo do Cravo, já o de lá cima quem manejava era do pai da Belica. Nesse tempo. Depois não sei se uniram o negócio, depois já só existia o da Queimadinha, eu só me lembro da Queimadinha.

Para onde levavam a cal?
- Ai meu Deus! Pois a cal seguia onde fizessem um prédio era levada às costas, até as pequenas e mulheres levavam. Desde aqui à Ponta Delgada. Também mais longe, uma pessoa a pé não podia andar. Eu ainda levei para a Vargem. Eu só podia com um alqueire de cal, nem sequer sei quantos quilos era nesse tempo. Em cal talvez seja mais peso. Mas era só um alqueire. Já os meus irmãos eram mais crescidos, só o que fazia era aquilo queimava muito as mãos, eram mais crescidos, já eles já podiam levar dois alqueires e não era mais. E quem era homem podia levar três ou quatro. A cal era pesada. A cal era mais pesada do que o grão dos cereais.

Para que servia a cal?
- Era só quando estavam fazendo o prédio. Por exemplo, fizeram ali uma casa onde o Sr. Padre dorme, vive, que é a casa paroquial, fizeram lá um prédio, eu mais os meus irmãos levamos cal para lá. Mas não era só nós. Era como numa romaria. Era só nas férias da escola, não se fazia aquilo nos dias da escola.

Ainda se recorda quanto é que recebia?
- Era um escudo. Um alqueire de cal era um escudo. Quem levasse dois alqueires era dois escudos. Era assim. E chegávamos lá já estava sempre o pagador para pagar. Voltava-se com aquele troquinho todos contentes (risos). E trazia-se para casa, não se o comia pelo caminho, que os pais, a mãe tinha que... Era só dispor dos filhos e não ter... Tinha-se que se organizar.

Sabe porque razão deixaram de produzir a cal?
- Depois o Sr. Jana depois que entrou noutros negócios já não... E depois aquilo ficou abatido com aquela quebrada que matou dois homens. Aquilo já... Depois começou a vir cal do Porto Santo, a cal do Porto Santo abateu, do Porto Santo ou do... Isso já vinha em mais quantia. A daqui deixou de ter aquela vendagem.

E ainda se recorda da olaria?
- Lembra-me que havia o lugar da olaria, mas nunca vi fazer as coisas, porque já daí para cá já estava abandonada. Quer dizer, depois que eu me lembro já a olaria estava abandonada.

Lembra-se das peças que produziam?
- Diziam que faziam telha e coisas de barro, mas eu nunca vi as coisas nem nada. Não vi, não posso dizer outra coisa.

Onde é que se localizava a olaria?
- É nos Lameiros, sabe que há ali aquele armazém que pertence a um irmão deste... daqui... o Tecla, que é aquela rapariga que está doente, que é da... aquela rapariga de Boaventura que tem estado em tratamento, aquela cerca grande que ela planta, agora a mulher não pode, mas plantava, tem lá um armazém e atrás tem um armazém que pertence à... uma irmã.... uma tia do Sr. Oliveira, que ela nunca vendeu, que é um armazém e uma cerca, e depois tem o camalhão da levada e a olaria ficava mais para o lado, para o lado do avesseiro. Era ali.

Maria Gregório de Oliveira, 79 anos

A senhora ainda se recorda da produção da cal?
- Sou filha do dono daquilo, do Forno da Cal. Nesse tempo era como se chamava, era uma empresa, era onde as pessoas iam ganhar o seu dia, os homens, havia muitos trabalhadores, muitos homens que iam para lá trabalhar, uns iam para a lenha outros iam tirar a pedra para cozer, coziam, preparavam aquilo tudo para cozer a lenha, a cal, a pedra, e depois tiravam do forno, tiravam a pedra e espalhavam no chão do forno e deitavam água por cima, para aquilo se desfazer para ficar em cal, para ficar a cal. Era peneirada, depois, ficava uma parte em pó, outra em pedra, que era para pintar as casas, as casas naquele tempo eram pintadas com a cal. Depois desfaziam a pedra para pintar as casas. E faziam a calçada toda, olhe isto aqui foi isso tudo com pedra de lá, sim. Foi de lá.

Havia muitas pessoas ligadas a esse trabalho?
- Muita gente trabalhava lá. As mulheres iam levar o comer aos homens que andavam lá e eu também ia levar ao meu pai. Ainda se fazia a venda. A mãe ficava na venda e tinha a minha irmã Belica... mas eu era a mais dedicada que ia lá levar o comer.

Como faziam para vender a cal?
- Para vender iam, iam mulheres e tudo. Aquela do, ela é que se lembra disso, a Alfonsa, ela não disse que ainda criou um casco na cabeça de acartar as sacas de cal. Iam até à Ponta Delgada levar. O transporte era a pé. E para o Rosário, para a igreja do Rosário. Era assim, era tudo a pé.

E recorda-se do acidente da pedreira?
- Lembro-me de quando caiu a quebrada, que morreram dois homens. Um chamava-se João Gregório e o outro, como era o nome do outro, Manuel do Lombo... deve ser Diniz, eram ambos do Cascalho. Foi uma quebrada. Estavam a furar e caiu a quebrada e ficaram atupidos, ficou lá a bota de um. Só depois de uns tempos é que encontraram a bota lá dentro da rocha.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Teresa Gregório de Andrade, 84 anos

A senhora ainda se lembra da olaria?
- A olaria foi feita vai-se por uns noventa anos, mais ou mais, não tenho bem a certeza, deve ser a olaria feita há noventa anos, ou mais, e depois da olaria estar feita, para fazer o barro tiravam acolá mesmo naquela terra que está em relva, que é do José Manuel ali em cima, que é dos da cal, que até era de uns senhores das Feiteiras, tiravam o barro lá e traziam para a eira, e na eira é que faziam a mistura e amassavam. Amassavam o barro na eira e depois levavam o barro para lá para fazer as formas.

Quais eram as peças fabricadas?
- Uma púcara... Faziam púcaras, faziam alguidares, faziam ressalgas e faziam infusas, aquelas infusinhas que só têm aquela coisinha de ir buscar a água com a asinha.

Para que serviam essas peças de barro?
- As infusas era para acartar água, que naquele tempo ninguém tinha água em casa, para ir buscar água onde era uma fonte, uma nascente, para a água conservar fresca dentro daquela púcara. Ainda me lembro de a Sra. Viúva tinha uma, e aqui em baixo, a do Sr. Januário também tinha uma e agora não sei se isso já acabou se não. As ressalgas era para salgar a carne do porco, que não havia congeladores. As púcaras era para deitar as banhas que eles derretiam do porco, e conserva bem nas púcaras, para deitar sal, o que fosse preciso, para conservar. Os alguidares faziam em grandes que era para quando as pessoas traziam gente pela fazenda, e faziam mais de entremeio para servir em casa e faziam pequeninos, faziam de todo o tamanho, os alguidares faziam de todos os tamanhos. Faziam umas travessas, umas travessas de barro assim compridinhas, com uma asinha de cada lado, isso então ainda me lembro de as ter ali... Aquela travessa servia para levar para o quarto de jantar quando tiravam o almoço, que naquele tempo eles coziam muito feijão e semilhas e batatas e depois aquilo era escorrido numa tampa e depois levavam para o quarto de jantar. A senhora punha aquela travessa assim no meio da mesa com uma toalha e voltava-lhe a tampa em cima e ali ficava o comer para irem comendo, não era com pratos (risos). Faziam umas tacinhas, a tacinha então não tinha asa, era uma tacinha redonda, não sei se se lembra, em tempos havia de vidro... faziam as tacinhas de barro também, umas maiorinhas e outras mais pequeninas, e aquilo depois ia para as vendas para eles venderem.

O olaria funcionava durante todo o ano?
- Eles faziam durante o Verão, que era onde dava melhor jeito, os dias maiores e de bom tempo, também, para arderem lenha. No Inverno fechavam.

Lembra-se porque deixou de funcionar?
- Isso depois, no resto, não deu muita vendagem. Fechou porque o barro não tinha saída, fechou. Esse senhor também foi lá para a vida dele, depois casou e foi para a vida dele, e estes daqui não sabiam fazer e acabou.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Maria Gregório de Andrade, 84 anos

Para que servia o moinho de pedra?
- Para moer milho, para moer trigo, para moer... fazia-se frangolho.

O que é o frangolho?
- Era o trigo moído e depois fazia-se, fazia-se como eles faziam caldo de farinha, na panela, e era frangolho, aquilo tinha... A gente andava à roda da minha mãe para se cozer e toda a gente falava em frangolho, tinha feito frangolho e a gente queria, queria aquilo, mas depois não se gostava. Era diferente do milho, não era como o milho. Quer dizer, moía-se, mas não se peneirava. Aquilo era assim, tudo farinha e... Para comer.

E usavam o moinho para mais alguma coisa?
- Quando o meu pai veio de fora trouxe café em grão e moeu-se no moinho. E o café era bom, era forte, era bom.

Maria Mendes de Freitas Luís, 75 anos

Fotografia: Estado actual do forno da olaria.

A senhora ainda se recorda da olaria?
- De andar na fazenda e ver aquilo lá de porta aberta, a minha mãe dizia que era uma olaria. Eu lembro-me é disto, a porta aberta e abafada com silvado e a minha mãe dizia que era uma olaria.

O que faziam nesse local?
- É de fazer alguidares de barro, púcaras e... salgas para salgar carne de porco. Naquele tempo não havia congeladores. Não sei mais nada. Sei que faziam coisas de barro. Faziam telhas...

Maria José Serrão, 77 anos

Foto: Prensa da oficina de ferreiro.

O que fazia o seu marido?

- O meu marido era ferreiro.

Quando foi que ele aprendeu essa arte?
- Ele trabalhou aqui, de novo, ele trabalhou até vinte e tal anos, quase trinta. Porque ele, claro, depois da gente casar ele já tinha mais uma idade. Mas enquanto era novo começou a trabalhar de ferreiro. E claro que, fazia enxadas, fazia foices, apontava escopros, aqueles escopros que davam fogo, aquele fogo que faziam um buraco para rebentar a pedra. Era essas coisas todas assim.

Quem é que lhe encomendava trabalho?
- Ele trabalhava para a câmara. Eles vinham cá para arranjar a ferramenta. Vinha até da Ribeira da Janela e de Ponta Delgada e desses lados, vinha tanta gente para aqui.

Tinha alguém que o ajudava?
- Ah! tinha às vezes até dois empregados. Tinha dois rapazes. Tinha o Clemente, das Lombadas, o meu cunhado também era ferreiro, também vinha ajudar. Um que era ferreiro, que era da Vargem também trabalhou com ele. Ah! E veio um do Funchal, também ajudar. Quando não estava um ele tinha de ir buscar outro. Eles levantavam-se de madrugada para bater ferro. E era esta cruz que se tinha. Nesse tempo tinha trabalho. Tinha trabalho porque o trabalho que era feito era todo assim... à mão, ferreiros e essas coisas todas. Não é como agora, que agora é tudo com máquinas que eles fazem uma coisa. Agora é diferente... Antes era diferente, era muito diferente.

O seu marido trabalhou a vida toda como ferreiro?
- Depois a gente embarcou-se e isso ficou por aí tudo... Ele dizia que ainda às vezes aquelas faquinhas que ele lá era... descarnava carne, quando caía o cabo, ele ia guardando as facas que era para quando chegasse aqui arranjar um cabinho. Mas, olhe, chegou aqui já veio doente e morreu-lhe a pachorra e nunca mais arranjou nada, nada disso. Já viu! Até um picão ele trouxe, que era de picar pedra, uma pedra mole que era para fazer passadas, ele ainda fez naquele canto, as passadas para subir por aqui acima.

Artur José de Andrade, 74 anos

Quando foi que começou a trabalhar os vimes?

- Eu comecei a trabalhar mais novo, agora... Eu trabalhei com 28, mais ou menos 28 anos... E se for coisa ainda faço, eu já não posso, mas eu faço.

Quais eram as obras que fazia?
- Fazia cestos de rocha, não aguentava, faziam cinco cargas daquilo. Era só cestos.

Como é que fazia para arranjar os vimes?
- Era apanhar, deitar numa goma, secava, depois para ir afogar para a água, para o poço. Aquilo era lá em tempos onde se tinha o arrebentão.

O senhor fazia muitos cestos?
- Não era 28 anos, era 26, 26 anos... Quer dizer, o mais que eu trabalhei foi isto. Fazia 8, 9 cestos por dia. Depois comecei em pedreiro.

Tinha alguém a ajudá-lo a fazer os cestos?
- Trabalhava outro, mas cada um trabalhava por conta do patrão, do Sr. Carlos Delgado, acolá da padaria, ele morava ao pé da padaria, ao lado de cima, naquela casa velha. Ele não morava, o pai dele, o pai dele é que morava lá. Fazia cestos e vendia, pois. Esteve-se tantos anos a mandar carros de cestos para a cidade. Vendia para firmas, para rocha. Estes cestos era para acartar rocha.

O senhor fazia cestos mais pequenos?
- Esses era só para casa. Tenho ali em baixo um disso. Servia para levar comer e ajuntar comer na fazenda e... Este, o dono deste já morreu, é o Sr. Joãozinho da Corrida, que era para ele. Este assim é para o lagar e de mão, cestos de mão mais ou menos como isto.

E cestos muito pequeninos?
- Ah! isso era mais uma parrilha. Para embelezar ou qualquer coisa.

Dedicou a sua vida à obra de vimes?
- Foi quase sempre em vimes, até meados de 40 anos, mas a seguir embarquei e depois vim e continuei a fazer isto outra vez. Havia eu e o Pereira acolá em cima, o Sr. Manuel Pereira e um da Lombada.

Dava algum tratamento especial aos vimes?
- O vime era cascado, a seguir ir secando, secar, guardar, e depois para a água outra vez para ficar mole para trabalhar outra vez. Qualquer uma obra disto tinha que ir à água.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

João de Sousa Capontes, morreu com 71 anos [entrevista à sua esposa Maria Teresa]

Qual era o trabalho do seu marido?
- Ele trabalhava de ferreiro, o meu marido chamava-se João de Sousa Capontes. Ele morreu com setenta ou setenta e um anos, olha, não tenho a certeza...

O que fazia ele?
- Fazia enxadas, arranjava foices de erva, fazia novas, fazia machados, fazia podoas, era de tudo o que o fulano precisava, ganchos, naquele tempo era para vir as cargas aqui para baixo, ele fazia disso tudo.

Onde começou a trabalhar?
- Primeiro trabalhou no Paul [da Serra] e a seguir veio-se embora e trabalhou ali acima da casa que era do senhor Antonino da Cruz, uma casa velha que está ali, nos Barros. Ah! Malho que eu peguei naquele peso de 13 quilos para puxar ferro... Eu junto com ele, ele com um malho e eu com outro, para estender enxadas... Tinha que ser. Eu tinha que deitar a mão no estender a enxada, tinha que ser duas pessoas. Nos domingos eu trabalhava na tenda com uma abanada todo o dia, [trabalhava] todos os dias, todos os dias, e com duas rezes de gado no palheiro, terra para plantar, era eu sempre sozinha como o cão do arroz... mas ainda se anda aqui.

Como é que o seu marido ia para o trabalho?
- Já vinha carro à corrida. E ele então ia para a corrida e já ia no carro, já não sei por onde era o caminho. Mas era um carro daqueles de carga, com pessoal. Trabalhava muita gente, como cisco. Era uma quantidade de homens, uns a furar rocha pela rocha dentro, outros a limpar... E estavam vigias de um lado e do outro para controlar e também para quanto fosse para rebentar o fogo para abrir as pedras, metiam de um lado e metiam do outro para abrir um túnel, que onde está a levada daquele lado, que vai ter acolá ao ir para a Serra de Água, no Caramujo.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

António Viveiros Diniz, morreu com 67 anos [entrevista à sua esposa Maria José Serrão]

Qual era a profissão do seu marido?
- Era ferreiro. Era ferreiro desde a data em que ele era rapazinho, que ele se deu em dedicar a ir à serra, que o carvão era feito na serra, eles iam de manhã, de noite ainda para cima. Abril, Maio, que era tempo de Leste. Agora não passava licença para fazer...

Como é que faziam o carvão?
- E então eles iam de manhã, ainda de noite, cortavam a lenha, arrumavam , faziam uma “fogueiraça” e punham por baixo e vinham-se embora. Ele mais o irmão, ou se não fosse ele mais o irmão levavam um homem ou dois homens, que o meu sogro já não ia. E então, depois de madrugada, pela noite adiante, eles iam e queimavam a lenha, queimavam a lenha e apagavam com terra, porque não tinha água, era terra cavada para apagar, metiam o carvão em sacas e traziam pelas serras abaixo, pela Achadinha, o Curral e essas coisas, e punham nos palheiros. E vinham-se embora e depois de noite para se desenrascar traziam estas saquinhas de guano, não traziam uma saca grande, não traziam uma saca grande.

Porque é que traziam pouco de cada vez?
- Aquilo era uma coisa que era leve. Uma saquinha de guano pode-se calcular mais ou menos que peso é que tinha. Porque se eles viessem com uma saca grande e por acaso por azar encontrassem algum malfazejo que desse parte dele, ou que a polícia, a guarda, que andava a guarda na serra, eles apanhavam-se já viam que andavam em coisa e então assim como era uma coisinha e às vezes meia saquinha, que era para um desenrasquezinho, e eles iam passando isso tudo noite rasa.

Quando é que o seu marido começou aquela arte?
- E depois o pai dele ficou sem poder trabalhar e depois foi quando casamos e ele fez a tenda acolá adiante, renovou a tenda, depois a tenda escangalhou-se, e depois foi quando ele fez a tenda aqui e ali um lagarzinho. Ele começou a trabalhar então só.

O seu marido trabalhava só na oficina?
- Só, quer dizer, ele quase nunca estava só. Quando era para estender uma enxada nova ou quando era para estender um pedaço de ferro, que aquilo o ferro vinha assim bruto, como um pedaço de pau, e para “espalmejar” um pedaço de ferro assim, para ficar numa enxada, não é à base de um braço de um homem só, de uma pessoa só. Então vinha este irmão do Agostinho Francisco, o que está hoje no Porto Moniz, vinha ajudá-lo, este também que depois que já se ia arrebitando também vinha e aquele aqui da achada, lá além... O senhor não conhece... O pai do Manuel que estava lá fora que morreu a mãe... Isso era sobrinho do meu sogro, ele então vinha, e depois isto aqui era um palheiro de gado e tinha um sobrado por cima e ele às vezes vinha e passava o dia aqui, e à noite dormia no palheiro.

Quais eram as ferramentas que o seu marido fazia?
- As ferramentas era de tudo: fazia a “pedoa”, fazia a enxada, fazia a foice, fazia a faca, fazia a pá do forno, para o pão, para amassar, fazia ferro de portas, que agora as portas são tudo diferentes, fazia os travessões para pôr atrás das portas para aparafusar, concertava fechaduras, era estas coisinhas assim.

O seu marido vendia muitas ferramentas?
- Sim, ele vendia. Ele fazia isso mas não era para ele. É porque eles precisavam. Vinha aí muita gente: vinha da Lombada, vinha da Ponta Delgada, vinha da Ponta do Sol, vinha do Seixal, vinham aqui pôr e marcavam a solução de vir buscar. Esses vinham buscar. Agora aqui, Cascalho ou Lameiros ou Aviceiro ou mesmo para cima eles diziam: Oh! Olhe, para não se vir buscar, quando estiver pronto o mestre que vá levar. Era a perdição dele porque ele gostava de beber e não se tinha e eles em vez de pagar o justo valor, daquilo que ele fez, davam-lhe uns canecos e ele ficava, pronto, ficava coisa, parece mesmo que estavam a ver porque as vendas se não é um é outro, viam, era o Ricardinho, era o Sr. Gregorinho, era o Sr. Gregório, eles já quando viam já o agarravam e não sei quê e o dinheirinho que ele trazia já ficava ali. Era a perdição dele, porque quando ele estava sério ninguém tinha nada com ele. A dificuldade dele era isto.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Maria Paixão Vera Cruz de Freitas, 75 anos

Qual foi a sua profissão?
- Antigamente era bordadeira.

Quando começou a bordar?
- A minha mãe começou-me a indicar alguma coisa disto eu tinha apenas 10 anos. Depois eu não fui à escola porque o meu pai não me deixou ir, porque não era obrigatório. Eu tinha mais irmãos pequeninos. E depois dediquei-me ao ponto do bordado e hoje a minha reforma é do bordado.

A senhora fazia muitos trabalhos?
- Fazia. Ia bordando às nadinhas, também como hoje eu bordo às nadinhas. Faço um lacinho aqui e ali, mas bordei muito anos.

A senhora trabalhava por conta própria?
- Não, era para a casa de bordados. Tinha um trabalho, a gente fazia e depois eles levavam e davam qualquer coisa. Nesse tempo o trabalho era muito mal pago. Depois casei-me com 22 anos, continuei sempre a bordar e o restante que eu não bordava era agricultora. Dedicava-me à agricultura. Portanto, que a minha vida foi assim. Sempre muito trabalho.

O que é essa pedra?

- É um moinho de pedra. Isto moía o milho à mão... milho e também se moía trigo. Para quem quisesse fazer uma papa chamada frangolho. (Ainda vai ser para eles rir.) Para comer, era farelo e tudo. Era frangolho.

Como é que o moinho funcionava?
- E então colocava-se um pau naquele buraco e lá em cima tinha um encaixezinho de pau, encaixava lá em cima, e então não era um só, e então para rodar esta pedra dentro daquela e a farinha caía ali. Era moído à mão. Ah! Em velocidade à mão, sem água, sem nada, era à força de braços.

Para que servia o moinho?
- Eles levavam milho para bisalhinhos, levavam mesmo para fazer sopa ou coisa... Era num moinho de pedra. O moinho de pedra é isto. Os moinhos que havia antigamente era isto. Podia estar um ano inteiro sem, porque se servisse uma vez ou duas vezes, mas estava com o cabo.

Sabe se o moinho é muito antigo?
- Isso então eu não sei, que isto já foi do casal do meu sogro.

Como faziam os moinhos?
- Eram pedras que tiravam, mas quer dizer, mas faziam, sim, faziam a forma do moinho, porque eles não iam... Ah, bem... Agora não sei se por aí abaixo podia ir alguma, mas nas ribeiras eles não viam assim uma pedra colocada com coisa. Era feita à forma da pedra de cima encaixar para andar de roda para moer o milho.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Manuel José, 80 anos

O senhor ainda se lembra da olaria?
- Lembro-me da olaria e do que eles faziam lá. Faziam tijolo, telha de canudo, “ressalgas”, “escuseiros” e o que mais, tinha mais um nome... púcaras, que era de ir buscar água, com uma asa e um bico para depois despejar a água... Havia lá quatro coisas... telhas de canudo, que já disse, “ressalgas” de salgar carnes, umas grandes e outras pequenas, púcaras, infusas, já eram essas coisas que era de ir buscar água, com um bico e uma asa e telha de canudo.

Quantas pessoas trabalhavam lá?
- Cinco ou seis pessoas. Uns a cozer e outros a amassar a massa, e outros a “botar” dentro da “machina” para aquilo andar de roda, andar de roda e... Depois de estar a massa feita, é o caldeirão a cozer, até ficar seca, aquilo estava seca, eles tiravam para a rua para ela ir secando à viração.

Eles trabalhavam durante todo o ano?
- Era meses, parava não sei quantos meses, dois ou três meses, ementes eles ainda tiravam mais massa, mais... não se preparavam com lenhos, que aquilo era com lenhas.

E fabricavam muitas peças?
- Naquele tempo, minha mãe, naquele tempo toda a gente tinha duas ou três peças para salgar carne, vinho e alhos, para buscar água à fonte que era com aquilo, com aquelas púcaras, tinha uma asa...

terça-feira, 9 de março de 2010

José Sousa Andrade, 67 anos

O senhor ainda se lembra do fabrico da cal?
- Lembro-me que ainda era pequenino, que o meu ainda andou trabalhando na pedreira. O meu pai era o homem que acartava barris de água, um barril era 50 litros. Era dois homens a brocar, com escorpo de aço e outro com uma maceta a bater, depois carregar de fogo, arrebentava, três ou quatro homens a acartar para ao pé do forno, dois homens a partir, um a cozinhar, às vezes era o patrão cá que... depois aquilo era puxada a pedra para o meio do salão, regar com água, com aguador ou mesmo com chuveiro, com água, depois era cirandada, arrumada num monte, depois é que vinham cá buscar para as obras.

O que faziam com a cal?
- Era vendido para obras, quem fazia casas, as casas daquele tempo eram tudo feitas com... chama-se vestir ou por o coisa da telha era tudo com cal e areia. Não havia força de cimento como há agora. E para vestir um tecto, chama-se o tecto da casa, era tudo com cal, cal e areia, pois claro...

Ainda se lembra de quantas pessoas trabalham no fabrico da cal?
- Podia ser 4 na pedreira, 2 a brocar e 2 coisa..., às vezes 3 ou 4 a acartar, conforme o patrão precisava, 2 a partir, 1 forneiro, que chama-se a cozinhar, 1 a cirandar e 1 a acartar água.

Recorda-se se fabricavam cal durante todo o ano?
- Isso então não posso jurar, mas pelo menos seis meses por ano era.

O que faziam para arranjar lenha?
- Já era separado. Cortavam rolos de lenha na serra, trambolhavam pelos corgos abaixo, rolos de carga de 100kg.-120kg., conforme, e para cozinhar a pedra, isso já era separado. Eles compravam a quem cortava a lenha.

Como vendiam a cal?
- Depois era transportado para quem precisava... era cal para o Funchal, era cal para a Boaventura, era cal para quem precisava... Nesse tempo era carregado às costas aqui para a Vila, o meu pai ainda chegou a levar cal a Boaventura às costas, e a mãe do José Ponte e o pai levaram para a Serra de Água, conforme, nesse tempo não havia carro... Havia carro mas não havia era dinheiro.

As sacas eram pesadas?
- Sim, uma saca era 7... nesse tempo era alqueires, podia ser uma coisa de 50kg.-60kg. cada saca de cal. Quer dizer... Se o senhor precisasse de 10kg. eles vendiam, compreendeu?

A pedra só servia para fazer cal?
- A pedra depois de cozida eles guardavam para derregar, derregavam num bidão com coisas... Esta coisa de pintores para pintar casas, nesse tempo havia era isso, não havia a tinta assim como há agora.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Maria Isabel Oliveira Sousa Capontes, 71 anos

Ainda se lembra do forno da cal?
- No forno da cal da Queimadinha, eles cortavam lenha, havia um buraco, a rocha era tirada em baixo na pedreira, acartavam, era uma camada de lenha, uma camada de pedra, uma camada de lenha, uma camada de pedra, uma camada de lenha, e depois pegavam lume de baixo para cima, pois eu vi, estava em baixo uns homens a tirar a pedra cozida para fora e lhe deitando água, que era para a pedra derreter, eu sei que eu vi muitas vezes com o meu pai trabalhando lá.

Onde trabalhava o seu pai?
- Era em baixo, na altura ele abrasou-se, abrasou-se nos braços ou... abrasou-se lá no tirar a rocha conforme ia caindo de cima para baixo, eles estavam por baixo, como tem ali, naquele de acolá. Era igual. Aquele de acolá e o de lá de cima era igual. Tanto eu vi acolá como vi lá em cima.

Havia mais alguém da sua família a trabalhar nesse forno?
- E depois era famílias, como a minha mãe, era pobrezinha, e o José Ponte aqui em cima, a mãe do José Ponte e outras famílias. A igreja do Rosário foi feita com essa cal, de lá. A gente acartava-se, ia-se lá buscar, levava-se o que agente se podia, eu mais a minha mãe e os que podiam. Subia-se, atravessava-se isto por aqui a baixo, pelos Barros para lá, até ao Foro, do Foro subia-se à Terça, e da Terça ia-se para o Rosário, sempre a acartar cal. Quer dizer, não era todo o dia, era um caminho por dia que se dava, para poder se ganhar qualquer dinheiro.

Quantos homens trabalhavam no forno da Queimadinha?
- Ah! Isso então aqui não tenho a certeza. Eu sei que trabalhava mais homens, mas os homens que eram não tenho... E já os homens que morreram em baixo, estavam a tirar a rocha.

A senhora conheceu-os?
- Conheci. Era o Manuel Gregório, daqui, que era o sogro do “Perdido” e o pai do... o marido... o pai daquela Teresa acolá, do senhor Manuel, acolá, chamava-se o “Pai do Queridinho”, o “Queridinho” está em Londres, que era o marido da “viuvinha do Lombo”, que chamavam à mãe da Teresa era a “viuvinha do Lombo”. Eles morreram no dia do Sagrado Coração de Jesus.

Ainda se lembra desse dia?
- Eu ainda era pequena. A gente ia-se, eu mais a mãe, ia-se para a Ribeira Grande cascar vimes e a gente ia-se ali, de manhã, ia-se com a senhora Laudina, o senhor não conhece mas a senhora daquele tempo trazia gente a acartar vimes para depois fazer cestos e fazer campas e aquilo tudo. A gente ia-se para a Ribeira Grande quando se era ali ao descer, agora tem a estrada mas antigamente era o caminho velho, a casa da mãe do tio José, o caminho era por ali para lá, da Teresinha Madeira, era por aí para lá, e a gente estava-se por aí para lá, quando eles a gritar acolá no palheiro do boi que tinha morrido duas pessoas na pedreira. Mas foi-se trabalhar, depois foi quando se soube que era o Manuel Gregório. Olhe, eu aqui não sei se era Manuel Gregório se era João Gregório. Aqui já não tenho bem a certeza. E o pai do “Queridinho”. E estavam a tirar rocha, e veio aquela peça... estavam numa furna a tirar rocha e veio uma taipa de cima para baixo. Os que puderam fugir, um acho que ainda ficou enterrado pelas pernas e os outros dois ficaram dentro da furna, afogaram. Tiraram-nos, mas morreram nessa altura. Isso cá eu lembro-me bem, já era uma raparigota.

Depois disso deixaram de trabalhar na pedreira?
- Continuaram. Nessa altura a cal era por conta do senhor Jana. Tiravam a cal era por conta do senhor Jana, porque quando eles abriram esta estrada aqui, ele ainda tirou a cal que era para levar lá pedra. Ele é que abriu esta estrada aqui só por causa desse forno da cal, da pedreira, já não era o forno, deixaram de cozer cal. Já era a pedreira para tirar rocha para levar para outros lugares.

Quando foi que isso aconteceu?
- A pedreira começou a funcionar anos depois, depois do senhor Jana resolver a tirar mais rocha e foi quando abriu esta estrada daqui lá cima. Olhe quando ele abriu esta estrada aqui talvez já tem uns quarenta anos, eu já tinha a minha casinha aqui, e a minha filha mais velha fez quarenta e seis ou quarenta e sete e ela tinha um aninho e tal quando se veio para aqui.

Como funcionava o tear?
- O tear era dois paus, assim sobre o comprido, e fazia outro pau assim, dois paus atravessados, um em cima e outro em baixo, em baixo fazia outro, fazia coisa... e tinha dois... setas, à moda de duas setas. E tinha um... na ponta fazia um buraquinho e eles metiam um atilho naquele buraquinho e noutro, que era para amarrar para cima para os liços, e conforme se mudava os pés, os liços, e em cima fazia outra, e fazia uma tornilha... acho que era assim, com o fio também estava metido lá e é que abria os liços para meter o algodão, para meter o retalho, para meter o linho, para meter o algodão para fazer favo, era isso tudo assim, e em cima fazia outro órgão onde se embrulhava o algodão. Embrulhava-se o algodão. Vinha o algodão de cima para baixo e metia-se neste liço e a seguir punha-se os fios assim trocados, assim na mão, e depois metia-se um neste lado e outro no fio da frente e ia-se fazendo sempre assim, sempre assim, da largura que a gente queria, o tapete ou a toalha ou uma coisa assim, e depois ia-se enrolando aqui conforme ia tecendo. Tinha um buraco aqui, no cabo do pau, um buraco aqui, um buraco em cima, que era para se meter uma turquês para se ir enrolando. Acolá para descer o algodão para baixo e este aqui para se ir enrolando o que a gente ia-se tecendo em baixo, e ficava aqui em baixo, conforme enrola, ficava aqui em baixo, e o tear era assim.

Que outros aparelhos eram necessários para tecer?
- Tinha outros aparelhos diferentes... Oh cão...! Que já não me lembro como era aquela coisinha pequenina... Tinha a dobadoira, que era de dobar o algodão para pôr em novelos, tinha... Ah! Era uma coisa pequenina... A mãe, Deus lhe dê o céu, tinha uma tábua assim, onde fazia-se, chamava-se o cincho ou... Uma coisa assim, fazia-se assim com a mão e ia-se fazendo a canelinha já dobando, a mãe tinha a passadeira, que era a tal que passava com uma tabuinha assim, punha-se um caninho de cana por dentro, quando eles faziam aquelas canelinhas todas para fazer o linho, para fazer favo. Era só para isso assim. O retalho cá era com uma cana, embrulhava-se era o retalho no que se chamava “cevadas”, e ia-se passando sempre assim e assim... A mãe tinha a coisa de fazer canelas... Tinha a dobadoira, tinha o pente, que é um pente de pôr em cima para o algodão descarregar, com muitas caninhas, assim, com muitas caninhas... A prima acolá em baixo tem isso tudo, a mãe também tinha isso tudo.

Onde faziam os fios usados no tear?
- O que se fazia com essa coisa com dentinhos... Primeiro enrolava-se acolá, uma puxava acolá e outra puxava aqui, que era para depois ficar as ramelas acolá, para ficar duro, para não ficar bambo, para o algodão não ficar bambo. Depois disso, punha-se a tal com os tais dentinhos assim à frente, para o algodão descansar, para depois ir metendo aquilo nos liços.

Havia muitos modelos de tapetes?
- O que fazia com o tear era tapetes de retalhos, a mãe, Deus lhe deu o céu, fazia com novelos, fazia com flores, fazia com “lagatinhos”, eu tinha também um com “lagatinhos”. Isto aqui chama-se riscas casadinhas, este aqui é igual, mas eu tenho aqui um.. chama-se espingardas, começava aqui estreitinho... começava aqui largo, acabava aqui estreitinho, começava uma aqui largo, acabava aqui estreitinho, novelos, flores que faziam em tapetes.

Além dos tapetes de retalhos, o que faziam com o linho e o algodão?
- E quando era linho, era linho a urdir acolá, era linho a urdir, linho daquele tempo que eles semeavam, e gramavam, e fiavam, era linho e embrulhavam o linho acolá e depois fazia-se as canelinhas e essa passadeira é que passava o linho, já não era retalhos, era linho igual, chamava-se toalhas de linho, e quando era favo, era favo, às vezes era algodão a urdir e linho a tapar, conforme eles queriam, e se eles queriam tudo branquinho era linho... era algodão acolá e algodão aqui a tapar. Ficava branquinho. Era favo, mas então cá eu nunca vi tecer.

As peças eram depois vendidas?
- Vendiam. Era acolá em baixo. Algodão, favo, era tudo toalhas... pessoas que mandavam tecer, encomendas...

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Teresa de Jesus Diniz, 87 anos

Qual era a sua arte?
Eu cá então era só tapetes. Já quando eu comecei era tapetes. Mas a minha mãe tecia linho e aquelas coisas de... favo. Era tudo tecido, mas era em favo. Era o nome das toalhas que teciam. Eu cá então foi só tapetes. Já quando eu entrei, já quando eu aprendi já não... a mãe já não tecia favos nem... já não aprendi aquilo, foi só tapetes. Mas ainda estive mais de vinte anos, mais de trinta anos a tecer.

E a senhora ganhava algum dinheiro?
Aph! Naquela altura o senhor não sabe que as coisas não davam, não serviam de nada. Era a fazenda e aquelas coisas que depois não dava para nada.

O que é que a senhora fazia?
Eu tecia, punha o preço no algodão e no meu trabalho, é que lidava os tapetes, para vender. Sabe que nem toda a “estacia” tinha linho. Tenho ali um rolo de tapetes se quiser tirar retratos...

Tinha alguém que a ajudava?
Eu cá trabalhava era só... sabe que no tear é uma pessoa só que trabalha. Eles é que faziam os retalhos e vinham trazer, depois eu tecia e eles levavam, pagando.

Havia mais teares nos Lameiros?
Teares, a Candinha tem o dela... Bem, se o senhor quiser tirar o retrato eu vou ali com a Teresinha, ela deve estar em casa...

Maria Teresa, 78 anos

Como faziam a ceifa do trigo?
- Ajuntava-se muito pessoal para apanhar o trigo, depois apanhava-se às mãos-cheias e dava-se ao ceifeiro para ele roçar, tinha um homem só para acartar o trigo. E a seguir apanhava-se aquela seara de trigo, já amanhã já se ia para outra e depois já se ia para outra e ia-se andando assim... E depois voltava-se atrás limpar o mato, o restolho tudo bem malhado, e amarrar às amassadouras para guardar, para abafar palheiros, porque os palheiros eram todos abafados a restolho. Naquele tempo era assim. Guardava-se o restolho, voltava-se atrás para riscar regos e para plantar rama. Era arrancar adubo do palheiro para a rua, assim em cima das costas como estou aqui e anda pô-lo às costas pela terra dentro, tanto diz eu como a minha irmã, como a outra que está lá fora “entramelada”, a Cristina.

Para que servia o trigo?
- Havia moinhos para moer o trigo e depois amassava-se pão de casa e pisava-se para se fazer sopa e guardava-se a semente. E semeava-se cevada, também se fazia sopa de cevada. Também era malhada...

Quantos moinhos havia?
- Havia um moinho lá em baixo, na Vila, ainda estão lá as paredes... Onde era esse moinho, abaixo da praça.

O que fazia mais?
- Eu andava nos vimes, lá em baixo na praça, a esgalhar vimes e acartar de braçado que estavam lá uns rapazes a aterrar contra a água para grelar para depois serem descascados. Era eu e minha irmã Cristina, que se andava lá as duas. Quando lá numa certa altura, ainda andei nas cascas dos vimes. A seguir já para baixo já não arranjaram mais, já era aqui em cima na Corrida que havia outra vez, essa coisa de vimes foi inté ao buraco da Ribeira Grande, bem ao cabo, ao pé da casa do velhinho... (esquece-me o nome) o Manuel dos Ramos. Fui até lá cascar vimes. E acartava-se depois de descascados pelo Lombo das Faias.

Os vimes serviam para quê?
- Os vimes serviam para cestos de vindima, para tampas, para obras, armários como ainda tenho para acolá um que também é de vimes, aqueles miudinhos, faziam um cestinho como aquele que está naquele canto, aquele. Era tudo para obras, tudo... E se um fosse apanhado a cortar um vime da serra de outro, para amarrar um molhinho de erva, era um levação que se lixava, e para dar ganho, bom, tinha-se que se avergar o serrote dois ou três dias para pagar o raio dos dois viminhos assim pequeninos para se amarrar um molhinho de erva para a gente. Não era nada de vimes grandes, eram aqueles pequeninos, dois viminhos amarradinhos, pronto, lá se ia embora. Comi lá umas vergalhadas que me derem que, não sei como não me mataram mesmo...

Cantigas de antigamente:

Chame da rua, chame o meu bem, que eu vou ir ao marco uma bolia... (o fôlego já é pouco...)
E dá-lhe??? que eu era nova, ao meu bem que eu, se era velha lá ia...

Cantiga da ceifa:
Vamos apanhar o trigo,
vamos lhe fazer a sesta,
vamos apanhar o trigo,
vamos lhe fazer a sesta,
para que o dono não diga,
que raça de gente é esta
Ai, ai ai que raça de gente é esta.